. dia 10/09/2008
Vindos de Madri, a partir da Estação Atocha Renfe, onde pegamos o trem rápido para Toledo, que sai do treminal AVE, a partir das 7 horas, sendo que o último retorna às 21:30 horas e a viagem leva cerca de 30 minutos.
Toledo, 80 km a sudoeste de Madri, é um município da comunidade autônoma de Castilla-La Mancha, declarada Conjunto Monumental Nacional em 1940 e cidade Patrimônio da Humanidade em 1986.
À uma hora de Madri, a “Jerusalém Espanhola” é o ponto de partida para uma viagem a um mundo medieval.
Outrora capital de uma tribo ibérica, foi tomada pelos romanos em 192 a.C. e denominada Toletum e conquistada pelos mouros no século VIII.
Em 1085, Afonso VI de Castela ocupou Toledo e estabeleceu controle direto sobre a cidade moura. Este foi o primeiro passo concreto do Reino de Leão & Castela na chamada Reconquista.
Tornou-se residência dos soberanos do reino, continuando a florescer como centro de arte e ensino.
Toledo era famosa por sua produção de aço, especialmente espadas, e a cidade ainda é um centro de manufatura de facas e pequenas ferramentas de aço.
Atingiu o ponto máximo de seu esplendor no final do século XV e primeira metade do século XVI.
Após Filipe II de Espanha mudar a corte de Toledo para Madri, em 1561, a cidade entrou em lento declínio.
Situada numa colina sobre o Rio Tajo (em Portugal vira Tejo), suas muralhas abrigam uma riquíssima herança cultural, arquitetônica e artística, que provem das culturas muçulmana, cristã e judaica, que aqui conviveram em relativa harmonia e expressaram um conjunto de influências medievais e renascentistas.
A cidade é uma verdadeira volta no tempo. Além de murada, as ruas são estreitas, com arcos ou portões dos séculos XIV, XV e XVI.
Pegamos um ônibus da Estação de Toledo à cidade antiga.
Um dos monumentos mais visíveis e visitados é o Alcazar de Toledo.
A história das construções no lugar onde se ergue o Alcazar começou na época romana, com a existência de um palácio do século III, edifício que foi restaurado durante os reinados de Afonso VI e Afonso X de Castela e modificado, em 1535, por ordem de Carlos I de Espanha (Carlos V do Sacro Império Romano-Germânico), o qual utilizou o Alcazar, em múltiplas ocasiões, como residência oficial dos Reis de Espanha.
Durante a Guerra Civil, o Alcazar foi utilizado como ponto defensivo e de resistência da Guarda Civil, tendo sido totalmente destruído pelas tropas apoiantes da Segunda República durante o cerco que durou 70 dias.
Depois da guerra, foi reedificado, albergando, atualmente, a Biblioteca de Castilla-La Mancha e o Museu do Exército.
Não foi possível visitar o Alcazar de Toledo, que estava fechado para obras. A edificação, destruída e reconstruída muitas vezes ao longo da história, é hoje monumento nacional. No século XVI, Carlos V converteu a fortaleza em residência real. Danificado nas guerras dos séculos XVIII e XIX, foi devastado em 1936, durante o cerco da Guerra Civil. A praça-forte, então escola de cadetes, foi cercada pelos republicanos. Seus moradores, que incluíam muitas mulheres e crianças, resistiram heroicamente durante cerca de oito semanas, até serem socorridos.
Contornamos o prédio percorrendo a Calle del General Moscardo, de la Union, até chegarmos a Calle de Miguel de Cervantes, onde fica o Museu Provincial de Santa Cruz.
O Museu Provincial de Santa Cruz fica em um hospital do século XVI e exibe uma coleção de tapeçarias medievais e renascentistas, entre muitas outras peças de arte, inclusive, quadros de El Greco.
Uma das obras primas de El Greco é “O Enterro do Conde de Orgaz”, que fica na Igreja de São Tomé. Seu tema é simples e genial – um retrato de personagens do céu e da terra, reunidos para celebrar a morte e a ressurreição do homem que semeou igrejas por toda Toledo.
Na parte superior da tela, Cristo, a Virgem, São Pedro e São João Batista à frente de uma corte de anjos e apóstolos.
Os personagens centrais são Santo Agostinho e São Estevão, que, de acordo com a lenda, voltaram a terra para sustentar o corpo do Conde de Orgaz no momento de sua morte.
El Greco escondeu seu auto-retrato no grupo de nobres toledanos, bem acima da cabeça de Santo Estevão.
Nas nuvens que cercam a alma do Conde, em forma de criança, amparada por um anjo, pode-se ver a figura de um cão, sempre presente nas pinturas de El Greco.
Se traçarmos duas linhas retas a partir das mãos estendidas do infante e de um dos nobres, elas apontam exatamente na mesma direção – o coração do morto.
Saindo do Museu Provincial de Santa Cruz, seguimos pela Calle de Miguel de Cervantes até a Plaza Santiago de los Caballeros, pegando, então, a Calle Santa Fé para sair na Calle Alfereces Provisionales e desta atravessar a Cuesta de Carlos V.
Entramos, então, na Calle Lucio, saindo na Plaza de la Magdalena, seguindo para a Plaza Solarejo, depois a Calle del Comércio e a Calle Hombre de Palo até a Catedral de Toledo, Santa Iglesia Catedral Primada.
Dos numerosos monumentos da cidade, o mais conhecido é a Catedral de Toledo, erguida entre 1226 e 1493, sobre a Igreja de Santa Maria de Toledo, do ano de 578. A mistura de estilos se deve à longa duração de sua construção. É uma das três catedrais góticas espanholas do século XIII. Um templo mariano por exelência. A 2ª mais rica, só perdendo para o Vaticano.
A principal fachada tem três portas: Puerta del Perdón, Puerta del Juicio Final e Puerta del Infierno. A primeira tem esse nome porque se costumava garantir indulgências àqueles que por ela entravam para pedir perdão. Hoje é aberta somente em ocasiões especiais. A terceira contém apenas decorações florais. Era usada para a procissão do Domingo de Ramos.
A “Sacristia Mayor” é um museu de obras religiosas, com trabalhos de El Greco, Goya, Van Dyck, Tristan, entre outros.
A Capela Maior é muito impressionante. Toda dourada e com muitos, mas muitos detalhes que narram a Paixão de Cristo.
Tem mais de 750 vitrais, 26 capelas, 120 m de comprimento e 32 m de altura.
Uma Missa Moçárabe* é celebrada nesta Catedral, uma vez por ano, por especial licença de Papa, quando praticam um incrível ritual dos tempos dos visigodos.
*Rito Moçárabe: rito utilizado nas igrejas de Espanha, desde o início do século VIII até o final do século XI. A palavra moçárabe se refere aos espanhóis que subsistiram ao domínio dos árabes quando estes se apoderaram da Espanha em 712 e significa árabes externos, diferenciando-os dos de origem árabe. Este rito chamava-se normalmente de rito gótico, por ter sido seguido pelos godos cristianizados.
Almoçamos no Largo Horno de la Magdalena, próximo ao nosso ponto de partida, o Alcazar.
Daí, partimos em direção à Sinagoga El Transito, uma das duas sinagogas que estão intactas. Durante o século XIV, Toledo tinha dez sinagogas, em vários locais da cidade.
Pela Calle Magdalena chegamos a Plaza de la Magdalena, percorrendo novamente a Calle del Comercio e a Calle Hombre de Palo, seguindo, então, pela Calle de la Trinidad até a Plaza del Salvador.
A partir daí, seguimos pela Calle Santo Tome e pela Calle de San Juan de Dios até chegar ao Paseo del Transito, para uma visita à Sinagoga del Transito e ao Museo Sefardí.
Um verdadeiro la – bi – rin – to !!!
A Sinagoga El Transito, do século XIV abriga o Museu Sefardita (nome escolhido pelos imigrantes hebreus para designar a Península Ibérica, com base nas antigas escrituras do Profeta Abdias), reunindo documentos e objetos que contam a história da presença judaica na Espanha, desde a chegada, na época romana, até a expulsão pelos reis católicos, com ênfase na época medieval (Idade de Ouro das comunidades judaicas na Espanha).
Mais uma vez retornamos ao nosso ponto de partida, o Alcazar.
Enquanto aguardávemos o horário do ônibus de volta a Gare, demos uma andada pela Calle Horno de los Bizcochos.
De ônibus da cidade antiga até a Gare e desta até a Estação Atocha Renfe, em Madri.
Como a cidade fica em La Mancha, um dos personagens principais é Dom Quixote, representado em várias lojas e souvenirs.
A opção de continuar esta viagem existe, senão veja:
– O Engenhoso Fidalgo D. Quixote de La Mancha, Volume 1
Miguel de Cervantes
Edição bilíngüe português-espanhol, acompanhada de notas especialmente preparadas para o leitor brasileiro, a partir das mais atualizadas edições do texto na Espanha, que esclarecem as centenas de personagens históricos citados, as alusões à política e ao contexto social da época, proporcionando uma leitura inteiramente renovada da obra magistral de Cervantes. Tradução para o português de Sergio Molina.
“Quando se sonha sozinho é apenas um sonho.
Quando se sonha juntos é o começo da realidade.”
D. Quixote
O título original completo era El ingenioso hidalgo Don Quixote de La Mancha, cuja primeira edição foi publicada em Madrid no ano de 1605.
O livro é um dos primeiros das línguas européias modernas e é considerado por muitos o expoente máximo da literatura espanhola.
Dom Quixote de La Mancha é uma fábula sobre a eterna luta da inteligência contra a estupidez, da luz contra a escuridão. A ação principal do romance gira em torno das três incursões feitas pelo protagonista e por seu fiel amigo e companheiro, Sancho Pança, que tem um perfil mais realista, por terras de La Mancha, de Aragão e de Catalunha.
O personagem principal da obra é um pequeno fidalgo castelhano que perdeu a razão pela leitura assídua dos romances de cavalaria e pretende imitar seus heróis prediletos. Envolve-se em uma série de aventuras, mas suas fantasias são sempre desmentidas pela dura realidade. O efeito é altamente humorístico. O verdadeiro nome do pobre fidalgo é Alonso Quijano (Quixano), chamado pelos vizinhos de o Bom. Já de certa idade, entrega-se à leitura desses romances e sua loucura começa quando toma por realidades históricas indiscutíveis as façanhas dos personagens dos livros, as quais comenta com os amigos, o cura e o barbeiro do lugar. Quijano investe-se dos ideais cavalheirescos de amor, de paz e de justiça, e prepara-se para sair pelo mundo, em luta por tais valores e por viver o seu próprio romance de cavalaria. Escolhe um título para si mesmo, o de Don Quixote de la Mancha, apelida um cavalo velho e descarnado com o nome de Rocinante e elege como dama ideal de seus sentimentos uma simples camponesa a quem dá o nome de Dulcinea del Toboso, suposta dama de alta nobreza.
O fiel escudeiro de Dom Quixote é definido por Cervantes como “homem de bem mas de pouco sal na moleirinha.” É o representante do bom senso e é para o mundo real aquilo que Dom Quixote é para o mundo ideal.
Quando Dom Quixote volta para casa, já está bastante cansado. Ele recupera a razão e volta a ser de novo o nobre Alonso Quijano, mas o próprio Sancho Pança, seu oposto no plano imaginário, o anima a partir em busca de novas façanhas heróicas !
Assim, entre realidade e imaginação, Miguel de Cervantes não toma partido de nenhum dos dois mundos. Fica a cargo do leitor perceber que talvez não exista nada real que não tenha um pezinho na imaginação, nem nada que, vindo da imaginação, não possa pisar devagarinho na nossa realidade. A herança de Dom Quixote é tão forte que existe até um adjetivo – quixotesco – para se referir aos homens que, como o cavaleiro, são extremamente idealistas.
Disquisição na insônia
Que é loucura; ser cavaleiro andate
Ou seguí-lo como escudeiro ?
De nós dois, quem o louco verdadeiro ?
O que, acordado, sonha doidamente ?
O que, mesmo vendado,
Vê o real e segue o sonho
De um doido pelas bruxas embruxado ?
Eis-me, talvez, o único maluco,
E me sabendo tal, sem grão de siso,
Sou – que doideira – um louco de juízo.
Poerma de Carlos Drummond de Andrade
sobre Dom Quixote
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